Uma das mais infelizes e trágicas características
de nossa civilização é a excessiva desobediência aos pais da parte dos filhos,
quando menores, e a falta de reverência e respeito, quando grandes.
Infelizmente, isto se evidencia de muitas maneiras inclusive em famílias
cristãs.
Os filhos
obstinados ou mimados não apenas trazem para si mesmos perpétua infelicidade,
mas também causam desconforto para todos que se relacionam com eles e
prenunciam coisas ruins para os dias vindouros.
Na maioria dos casos, os filhos são menos culpados
do que seus pais. A falta de honra aos pais, onde quer que a achemos, deve-se,
em grande medida, aos pais afastarem-se do padrão das Escrituras. Atualmente, o
pai imagina que cumpre suas obrigações ao fornecer alimento e vestuário para os
filhos e, ocasionalmente, ao agir como um tipo de policial de moralidade. Com
muita frequência, a mãe se contenta em desempenhar a função de uma criada
doméstica, tornando-se escrava dos filhos, realizando várias tarefas que estes
poderiam fazer, para deixá-los livres em atividades frívolas, ao invés de
treiná-los a serem pessoas úteis. A consequência tem sido que o lar, o qual
deveria ser, por causa de sua ordem, santidade e amor, uma miniatura do céu,
degenerou-se em “um ponto de parada para o dia e um estacionamento para a
noite”, conforme alguém sucintamente afirmou. Antes de esboçarmos os deveres
dos pais em relação aos filhos, devemos ressaltar que eles não podem
disciplinar adequadamente seus filhos, a menos que primeiramente tenham
aprendido a governar a si mesmos. Como podem eles esperar que a obstinação de
suas crianças sejam dominadas e controladas as manifestações de ira, se eles
mesmos dão livre curso à seus próprios sentimentos. O caráter dos pais é
amplamente reproduzido em seus descendentes. “Viveu Adão cento e trinta anos, e
gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem” (Gn 5.3). Os pais devem
eles mesmos viver em submissão a Deus, se desejam obediência da parte de seus
filhos. Este princípio é enfatizado muitas e muitas vezes nas Escrituras. “Tu,
pois, que ensinas a outrem, não te ensinas a ti mesmo?” (Rm 2.21). A respeito
do pastor ou presbítero da igreja está escrito que ele tem de ser alguém “que
governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o
respeito (pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da
igreja de Deus?)” (1 Tm 3.5). E, se um homem ou uma mulher não sabem como
dominar seu próprio espírito (Pv 25.28), como poderão cuidar de seus filhos?
Deus confiou aos pais um solene e valoroso privilégio. Não exageramos ao
afirmar que em suas mãos estão depositadas a esperança e a bênção, ou a
maldição e a ruína da próxima geração.
Suas famílias são os berçários da Igreja e do Estado,
e, de acordo com o que agora cultivam, tais serão os frutos que colherão
posteriormente.
Eles deveriam cumprir seu privilégio com bastante
diligência e oração. Com certeza, Deus lhes pedirá contas referente à maneira
de criarem seus filhos, que a Ele pertencem, sendo-lhes confiados para
receberem cuidado e preservação.
A tarefa que Deus confiou aos pais não é fácil, em
especial nestes dias excessivamente maus. Entretanto, poderão obter a graça de
Deus, se a buscarem com sinceridade e confiança. As Escrituras nos fornecem as
regras pelas quais devemos viver, as promessas das quais temos de nos apropriar
e, precisamos acrescentar, as terríveis advertências, para que não realizemos
essa tarefa de maneira leviana.
Instrua seu filho
Queremos mencionar aqui quatro dos principais
deveres confiados aos pais. Primeiro, instruir seus filhos. “Estas palavras
que, hoje, te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e
delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e
ao levantar-te” (Dt 6.6-7). Este dever é sobremodo importante para ser
transferido aos outros; Deus exige dos pais, e não dos professores da Escola
Dominical, a responsabilidade de educarem seus filhos. Tampouco essa tarefa
deve ser realizada de maneira esporádica ou ocasional, mas precisa receber
constante atenção. O glorioso caráter de Deus, as exigências de sua lei, a
excessiva malignidade do homem, o maravilhoso dom de seu Filho e a terrível
condenação que será a recompensa de todos aqueles que O desprezam e rejeitam —
estas coisas precisam ser apresentadas constantemente aos filhos. “Eles são
pequenos demais para entendê-las” é o argumento de Satanás, visando impedir os
pais de cumprirem seu dever. “E vós, pais, não provoqueis vossos
filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor” (Ef 6.4).
Temos de observar que os “pais” são especificamente mencionados neste
versículo, por duas razões: eles são os cabeças das famílias e o governo desta
lhes foi confiado; os pais são inclinados a transferir sua responsabilidade às
esposas. Essa instrução deve ser ministrada através da leitura da Bíblia e de
explicar aos filhos as coisas adequadas à sua idade. Isto deveria ser
acompanhado de ensinar-lhes um catecismo. Um constante falar aos mais novos não
se mostra tão eficiente quanto a diversificação com perguntas e respostas. Se
nossos filhos sabem que serão questionados após ou durante a leitura bíblica,
ouvirão mais atentamente: fazer perguntas os ensina a pensarem por si mesmos.
Este método também leva a memória a reter mais os ensinos, pois o responder
perguntas definidas, fixa idéias específicas em nossas mentes. Observe quantas
vezes Jesus fez perguntas aos seus discípulos.
Seja um bom exemplo
Segundo, boas instruções precisam ser acompanhadas
de bons exemplos. O ensino proveniente apenas dos lábios provavelmente será
ineficaz. Os filhos são espertíssimos em detectar inconsistências e rejeitar a
hipocrisia. Neste aspecto, os pais precisam humilhar-se diante de Deus, buscando
todos os dias a graça que desesperadamente necessitam e somente Ele pode dar.
Que cuidado eles precisam ter, para que diante de suas crianças não digam e
façam coisas que tendem a corromper suas mentes ou produzam más consequências,
se elas as imitarem! Os pais necessitam estar constantemente alertas contra
aquilo que pode torná-los desprezíveis aos olhos daqueles que deveriam
respeitá-los e honrá-los. Não apenas devem instruir seus filhos no caminho da
santidade, mas eles mesmos devem andar neste caminho, mostrando por sua prática
e conduta quão agradável e proveitoso é ser orientado pela lei de Deus. No lar
de pessoas crentes, o supremo alvo deve ser a piedade familiar — honrar a Deus
em todas as ocasiões —, e as outras coisas, subordinadas a este alvo.
Quanto à vida familiar, nem o esposo nem a esposa
deve transferir para o outro toda a responsabilidade pelo aspecto espiritual da
vida da família. A mãe com certeza tem a incumbência de suplementar os esforços
do pai, pois os filhos desfrutam mais de sua companhia. Se existe a tendência
de os pais serem muito rígidos e severos, as mães são propensas a serem muito
brandas e clementes; portanto, têm de vigiar mais contra qualquer coisa que
enfraquecerá a autoridade do pai. Quando este proibir alguma coisa, ela não
deve consenti-la às crianças. É admirável observar que a exortação dada em
Efésios 6.4 é precedida por “Enchei-vos do Espírito” (Ef 5.18); enquanto a
exortação correspondente em Colossenses 3.21 é precedida por “habite,
ricamente, em vós a palavra de Cristo” (v. 16), demonstrando que os pais não
podem cumprir seus deveres, a menos que estejam cheios do Espírito Santo e da
Palavra de Deus.
Discipline seu filho
Terceiro, a instrução e o exemplo precisam ser
reforçados mediante a correção e a disciplina. Antes de tudo, isto implica no
exercício de autoridade — a correta aplicação da lei divina. A respeito de
Abraão, o pai dos fiéis, Deus afirmou: “Porque eu o escolhi para que ordene a
seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do SENHOR
e pratiquem a justiça e o juízo; para que o SENHOR faça vir sobre Abraão o que
tem falado a seu respeito” (Gn 18.19).
Pais crentes, meditem nestas palavras com cuidado.
Abraão fez mais do que simplesmente dar conselhos: ele ensinou com vigor a lei
de Deus e ordenou sua casa. As regras com que ele administrou seu lar tinham o
objetivo de seus filhos guardarem “o caminho do SENHOR” —
aquilo que era correto aos olhos de Deus. Este dever foi cumprido pelo
patriarca a fim de que a bênção de Deus estivesse sobre sua família. Nenhuma
família pode crescer adequadamente sem leis familiares, que incluem recompensas
e castigos. Isto é especialmente importante na primeira infância, quando ainda
o caráter moral não está formado e as crianças não apreciam ou entendem seus
motivos morais. As regras devem ser simples, claras, lógicas e flexíveis, tais
como os Dez Mandamentos — poucas mas relevantes regras morais, ao invés de
centenas de restrições insignificantes.
Uma das maneiras de provocarmos desnecessariamente
nossos filhos à ira é atrapalhá-los com muitas restrições insignificantes e
regras detalhadas e arbitrárias, procedentes de pais perfeccionistas. É de
vital importância para o bom futuro dos filhos que estes sejam trazidos em
submissão desde cedo. Uma criança malcriada representa um adulto ímpio — nossas
prisões estão superlotadas com pessoas que tiveram a liberdade de seguirem seus
próprios caminhos durante sua infância. A mais leve ofensa de uma criança
quebrando as regras do lar não deve ficar sem a devida correção; pois, se ela
achar clemência ao transgredir uma regra, esperará a mesma clemência em relação
a outras ofensas, e sua desobediência se tornará mais frequente, até que os
pais não tenham mais controle, exceto através do exercício de força brutal. O
ensino das Escrituras é claro quanto a este assunto. “A estultícia está ligada
ao coração da criança, mas a vara da disciplina a afastará dela” (Pv 22.15; ver
também 23.13- 14). Por isso, Deus afirmou: “O que retém a vara aborrece a seu
filho, mas o que o ama, cedo, o disciplina” (Pv 13.24). E, ainda: “Castiga a
teu filho, enquanto há esperança, mas não te excedas a ponto de matá-lo” (Pv
19.18). Não permita que uma afeição insensata o impeça de cumprir seu dever.
Com certeza, Deus ama seus filhos com um sentimento paternal mais profundo do
que você ama seus filhos, mas Ele nos diz: “Eu repreendo e disciplino a quantos
amo” (Ap 3.19; cf. Hb 12.6). “A vara e a disciplina dão sabedoria, mas a
criança entregue a si mesma vem a envergonhar a sua mãe” (Pv 29.15). A
severidade tem de ser utilizada nos primeiros anos de uma criança, antes que a
idade e a obstinação endureçam-na contra o temor e a pungência da correção.
Poupe a vara e você arruinará seu filho; não a utilize e terá de sofrer as consequências.
É quase desnecessário salientar que as Escrituras citadas anteriormente não têm
o propósito de incutir- nos a ideia de que nosso lar deve ser caracterizado por
um reino de terror. Os filhos podem ser governados e disciplinados de tal
maneira, que não percam o respeito e as afeições por seus pais. Estejamos
atentos para não estragarmos seus temperamentos, por fazermos exigências
ilógicas, e provocá-los à ira, por castigá-los expressando nossa própria ira. O
pai têm de punir um filho desobediente não porque ficou bravo, e sim porque é
correto fazer isso — Deus o exige, bem como a rebeldia de seu filho. Nunca faça
uma ameaça, se não tenciona cumpri-la. Lembre que estar bem informado é bom
para seu filho, mas ser bem controlado é ainda melhor. Esteja atento às inconscientes
influências que cercam seu filho. Estude meios para tornar seu lar atraente,
não pela utilização de recursos carnais e mundanos, mas por servir-se de ideais
nobres, por incutir- lhes um espírito de altruísmo e desenvolver uma comunhão
agradável e feliz. Não permita que seus filhos se associem a más companhias.
Verifique cautelosamente as revistas e livros que entram em seu lar, observe os
amigos que ocasionalmente seus filhos convidam para vir ao lar e as amizades
que eles estabelecem. Antes mesmo de o reconhecerem, muitos pais permitem seus
filhos relacionarem-se com pessoas que arruínam a autoridade paternal,
transtornam seus ideais e semeiam frivolidade e pecado.
Ore por seus filhos
Quarto, o último e mais importante dever, no que se
refere ao bem-estar físico e espiritual de seus filhos, é a intensa súplica a
Deus em favor deles. Sem isto, todos os outros deveres são ineficazes. Os meios
são inúteis, exceto quando o Senhor os abençoa. O trono da graça tem de ser
fervorosamente buscado, para que sejam coroados de sucesso os nossos
esforços em educar os filhos para a glória de Deus. É verdade que precisa haver
uma humilde submissão à soberana vontade de Deus, um prostrar-se ante a verdade
da eleição. Por outro lado, o privilégio da fé consiste em apropriar-se das
promessas divinas e em recordar que a ardente e eficaz oração de um justo
produz muitos resultados. A Bíblia nos diz que o piedoso Jó “chamava... a seus
filhos e os santificava; levantava-se de madrugada e oferecia holocaustos
segundo o número de todos eles” (Jó 1.5). Uma atmosfera de oração deve permear
o lar e ser respirada por todos os que dele compartilham.
Autor: A. W. Pink
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