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terça-feira, 22 de junho de 2010

CALVINISMO E CAPITALISMO

Introdução:

Abordaremos sucintamente o papel atribuído a Calvino no desenvolvimento do Capitalismo e as diversas interpretações de sua influência. Historiadores diversos têm ensaiado determinar a influência de Calvino e do Calvinismo na implantação do sistema econômico moderno que desenvolveu no Ocidente e caracteriza a sua civilização. Teses opostas se têm defendido alternativamente, uns fazendo de Calvino o pai espiritual do Capitalismo, outros negando que uma influência moral ou espiritual possa ter qualquer efeito sobre o jogo das forças econômicas.

No trabalho em apreço, nos propomos apresentar de forma sucinta um resumo dos principais argumentos de alguns dos diversos opositores teoristas.

Conteúdo proposto:

1) Max Weber e Ernest Troeltsch

2) R. H. Taeney, H. Hauser e os Modernos

3) Conclusão

Werner Sombart: Os puritanos capitalistas são judeus que se ignoram; Sombart afirmava que os judeus tinham exercido influência sobre a evolução econômica em razão de suas aptidões étnicas, bem como de sua formação intelectual e religiosa. Acrescentava que os puritanos, tal como os judeus, contribuíram para o nascimento do espírito do capitalismo – aparentava com religião judaica

Max Weber: Os puritanos estão na origem do capitalismo. Por quê? Weber esboçava demonstração análoga em relação aos puritanos. “os protestantes, proporcionalmente, são os mais numerosos entre os detentores de capital e os empresários,...
Porque têm eles um espírito capitalista. Que espírito é esse? Bem parece que o protestantismo seja o gerador desse “espírito”. Quais as reais características do espírito capitalista? Indaga Weber... “Benjamim Franklin”: ‘Lembra-te de que: tempo é dinheiro”; crédito é dinheiro; o dinheiro é prolífico e produtivo; segundo um provérbio, um bom pregador é senhor de todas as bolsas’...

Ganhar é um dever: Todos os sentimentos, a honra, a pontualidade, o zelo, a sobriedade são visualizações sob o ângulo do lucro - O “Summum bonum”,... Não por gozo, mas por motivo de consciência: a moral é condicionada pelo sistema econômico. O sistema criou uma “superestrutura” da sociedade, não o inverso. Condição de progresso: liberação de tradição: De onde provem este espírito capitalista?
Os protestantes emprestaram ao trabalho seu sentido cristão: uma vocação: Esse ensino reformado proclamou que a atividade profissional e a função social tinham valor moral e religioso; E por quê? Por causa do dogma da predestinação... O dogma da predestinação engendrou o individualismo: Este individualismo sagrado é comunicado pelo Calvinismo a toda organização social criando um sentimento profano nas populações protestantes secularizadas Lutero já havia dito, mas em Calvino há um matiz muito importante: “o autêntico serviço do próximo é a busca da glória de Deus e não a glória da criatura. Este é o fim último comum a todos os atos e a todas as atividades da vida que dá à existência inteira, segundo a moral calvinista, um caráter ascético”, E transformou o ascetismo medieval em moral e ação – Todos os atos do indivíduo tem um valor religioso.
Como Engendrou esta Moralidade o Sistema Capitalista? Qual a relação entre a ascese profissional calvinista e o surto do capitalismo? Richard Baxter foi um dos mais típicos representantes desta ética puritana oriunda do calvinismo – eminentemente irônico e universalmente conhecido por seu incansável labor e dinamismo em busca de inovações e empreendimentos novos... os puritanos vão muito além de Calvino e anunciam uma ascese que repudia toda busca deliberada dos bens temporais.“A pregação puritana insiste de modo cada vez mais acentuado, no valor moral e religioso do trabalho. O trabalho é colocado acima de tudo mais como o alvo que Deus destinou à vida dos homens”.
A nova moral engendra a divisão do trabalho e o dinamismo do empreendimento – Na questão da divisão do trabalho e da solidariedade das profissões na vida social, Weber observa que o puritanismo exibe uma concepção nova. A ascese voluntária unida à alta produtividade utilitária engendra necessariamente a poupança O ascetismo profissional protestante age, no desenvolvimento do capitalismo, na sua moral e no ativismo prático, estimulando a produção para o enriquecimento. Ademais, insiste o puritanismo sobre a economia pessoal: “o homem não é senhor de seus bens e sim gerente e dar conta do mínimo centavo. Tudo deve servir a só glória de Deus, quanto maior a riqueza, maior a responsabilidade diante de Deus”.
Característica dos ricos protestantes: Elegância austera - Define-se pelo estilo de conforto puritano que o “espírito capitalista”. Caracteriza-se pela tendência de produzir muito e consumir pouco, levando-o ao acúmulo de capital – evolução econômica na Nova Inglaterra, como também na Holanda.
A secularização do espírito protestante engendra o espírito burguês e conduz ao realismo cruel do mundo dos negócios – O entusiasmo religioso foi secularizado e esvaziou-se das preocupações espirituais anteriores.

Ernest Troeltsch: Com Calvino passa-se da noção medieval estática da profissão e da sociedade à noção dinâmica moderna.
“Calvino compartilha com Lutero” a noção da vocação profissional, fazendo do trabalho, culto a Deus e meio de subjugar o corpo e lutar contra as tentações da carne... Se Lutero não pensava que fosse lícito deixar o quadro profissional, que se havia escolhido, Calvino tinha uma noção inteiramente dinâmica da profissão e da sociedade. Ele se preocupava em dar ocupação aos pobres e desocupados – sua concepção em relação ao empréstimo a juros, difere radicalmente de Lutero.

Crítica destas doutrinas - Refutando os teoristas
A luz do pensamento econômico e social de Calvino, não é difícil observar tudo que há de justo e tudo que há de fundamentalmente falso nas afirmações de Weber e Trocltsch. Certamente existe correlação entre os fatos assinalados nas diversas seitas puritanas do séc. XVIII, o erro é identificar o puritanismo do séc. XVIII com o calvinismo de Calvino Quatro caracteres falsamente imputados ao Calvinismo:

1. Primado da predestinação;

2. Ascética do trabalho;

3. Desprezo dos prazeres e;

4. Virtude da poupança;

Émile Doumergue diz: contestáveis as teses de Weber, justa, no entanto, a conclusão.
Ele consagrou numerosas paginas à refutação das teses da Escola de Heidelberg (Weber e Troesltsch).
Por um lado, mostra a oposição que há entre as teorias de Weber e a doutrina de Calvino quanto ao ascetismo, ao luxo, ao dinheiro, (o espírito calvinista e o capitalismo) por outro, pensa, no entanto, que os protestantes têm sido mui naturalmente colocados no comando das indústrias capitalistas, graças à estrita moral do trabalho e da economia que o calvinismo lhes inculcou.

Georges Goyau: Não é a doutrina, mas o individualismo calvinista secularizado, que engendrou o individualismo capitalista
“não é a doutrina, mas o individualismo calvinista secularizado, que engendrou o individualismo capitalista em Genebra”. – Tanto Goyau como outros opositores, tratavam de idólatras os Genebrianos – “Homens do deus dinheiro”, para esses, Genebra permanece, em todos os domínios, a teórica e advogada dos direitos absolutos do individuo.

Louis Rougier – (1889-1982) Filósofo francês, professor de filosofia na Universidade de Besançon. Primeiro adversário do liberal e crítico do Capitalismo. Ele se tornou um dos promotores do chamado “Neoliberalismo“.
“O Calvinismo é a glorificação das virtudes burguesas” Ele retoma as teses de Weber e acusa Calvino de “exaltar a parcimônia, forçada até à avareza”, Assim que, no Reformador, o culto do trabalho e a parcimônia se compõem em uma força de poupança que produz o acúmulo de capital”. Ele também retoma as teses de Sombart, para afirmar que “os elementos do dogma puritano, não eram senão empréstimos às ideias que formam a base da religião judaica.

R. H. Tawney: Historiador econômico britânico (1880–1962) Professor de História Econômica, Universidade de Londres; observou que o puritanismo é um calvinismo deformado e secularizado.
Sobre a evolução econômica: “O puritanismo contribui para plasmar a ordem social, mas ele próprio foi mais e mais dela plasmado”; Analisou os textos originais de Calvino a respeito do empréstimo a juros; criticou Weber quanto ao espírito capitalista e diz que Calvino poderia protestar dizendo: “Eu não sou calvinista”... Ele considerava a concepção calvinista do capital como uma real linha divisória de águas...

Henri Hauser – 1866-1946. Calvino, pai do capitalismo, não, porém, do Capitalismo Como o liberalismo o fez evoluir. refuta as teses de Weber, mostrando que o Calvinismo nada tem em comum como o capitalismo puritano.
O historiógrafo francês, entregou-se à análise minuciosa dos textos de Calvino referente ao empréstimo a juros, que o levou, praticamente as mesmas conclusões de Tawnay “Calvino é o primeiro dos teólogos cristãos a interpretar, de maneira pertinente, os textos bíblicos relativos à usuras diferentemente da Escolástica tradicional do raciocínio lógico que postulava que “o dinheiro não pode produzir dinheiro”... comunga com Dumergue, Weber e Troclsch, sobre a influência única de Calvino sobre a evolução do pensamento religioso

André E. Sayous: recusa-se a ver entre calvinismo e capitalismo uma relação de causa e efeito. Para ele, “a influência que o calvinismo exerceu sobre os negócios durante a segunda metade do séc. XVI não pôde ser senão restrita por motivos de ordem moral. Ninguém foi mais autimamonistas que Calvino”.
Capitulação do Calvinismo genebrino posterior diante dos problemas sociais.
“É, então, verdade que onde a predestinação e a vocação quase não mais se constituíam o objetivo de discussão senão entre os teólogos, haja os homens de negócio protestantes retido a moldura mais do que o fundo destas doutrinas religiosas, para justificar sua atividade diante de Deus, e indiretamente diante de si mesmo?

Frédéric Hoffet: os calvinistas trabalhados inquietos Retoma sem citá-las, as teses de Weber, e as transpõe à história contemporânea. Constata-se hoje, diz ele, que os países poderosos e ricos são os protestantes, pois as riquezas naturais não explicam este fenômeno – a riqueza dos Estados Unidos é o seu poderio. Mas, outros países, igualmente ricos jamais atingiram um grau de riqueza simplesmente aproximado. Assim é que o México permaneceu pobre e as Repúblicas Sul-Americanas esperam a chegada dos protestantes do Norte para explorar os seu prodigiosos tesouros.

John U. Nef: sobre a gênese da civilização industrial, procurou determinar as causas do surto econômico do Ocidente; e é na Reforma que as pretende achar. Para ele, a civilização industrial é diferente de todas as civilizações anteriores pelo fato de que a busca do quantitativo leva a alma a buscar o qualitativo. Seria errôneo confundir civilização industrial e capitalismo.

Os reformadores tiveram grande papel na evolução da história econômica, diz Nef; não em razão de suas doutrinas relativas à moral econômica, não muito diferente do ensino tradicional, quanto em virtude de suas concepções de igreja.
Com a Reforma, os bens da igreja foram secularizados e a influência desta em favor de uma produção qualitativa diminuiu. “De todos os pontos de vista, a função da igreja e do clero na vida foi reduzida pelo protestantismo. O que caracteriza o Protestantismo, em face do Catolicismo – reforjado pelo Concilio de Trento é um pessoal e uma renda muito reduzidos, pouca propriedade predial, poucas cerimônias, indisposição, por vezes mesmo uma ojeriza, para com as imagens e a maior parte das obras de arte religiosas consideradas como puras manifestações de idolatria.
Nef contradiz a tese de Sombart que presume que as guerras – e notadamente as de religião – contribuíram para a aceleração da produção industrial.

CONCLUSÃO

Qual é, em definitivo, a influência de Calvino sobre o desenvolvimento do capitalismo hodierno?
Com base no exposto, é possível fazer algumas observações à guisa de conclusão:
1) É a grande distância que separa Calvino do calvinismo posterior e, particularmente, do protestantismo reformado e do puritanismo contemporâneos da revolução industrial – sem analisar as causas das transformações que sofreram os herdeiros do Reformador no domínio de fé e da ética social; permitido nos é afirmar que não é lícito imputar a Calvino e ao Calvinismo original a influência, sadia ou não, que seus longínquos descendentes poderiam ter tido sobre o desenvolvimento do capitalismo.
2) Não se pode fugir à verificação de que a atitude e o pensamento de Calvino representam, de fato, uma virada na história das relações entre a igreja e o mundo econômico e social.
3) A principal característica da atitude reformada, em relação ao mundo, reside na distinção muito clara se faz entre a vida de fé e a vida política e na natureza do elo que une estas duas esferas da existência.
Enquanto, no curso dos séculos, a teologia ora funde estes dois mundos, ora separa de forma absoluta, Calvino os situou numa relação judiciosa que não os contrapõe nem confunde. O Calvinismo de origem contribuiu para tornar muito mais fáceis, no seio das populações reformadas, o desenvolvimento da vida econômica e o surto do capitalismo nascente.
O Calvinismo de origem contribuiu para tornar muito mais fáceis, no seio das populações reformadas, o desenvolvimento da vida econômica e o surto do capitalismo nascente.
Calvino não admitia, nem esboçava, a ideia de que para o cristão, a vida econômica e financeira pode ter suas próprias regras morais e subtrair-se ao eterno desígnio do amor e da justiça de Deus para os homens; ele se opôs, com máximo vigor, aos vícios e aos perigos do capitalismo. Não é possível, honestamente, atribuir a Calvino a responsabilidade da evolução do capitalismo sob sua forma histórica. Não pôde o capitalismo desenvolver-se, sob esta forma, entre populações protestantes, senão em função de um afrouxamento da doutrina e da moral reformada.


Síntese Organizada por:Zé Francisco - Aluno do STNe em Teresina, Pi


(Retirado do Livro “O Pensamento Econômico e Social de Calvino”, André Biéler – Capítulo VI, Pp.621 – 662).

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