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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Como entender a Bíblia; É possível ler e compreender-la

Mensagem clara, isto é, Deus fala para ser entendido
Muitos pensam, erroneamente, que apenas um seleto grupo de estudiosos é competente para interpretar a Bíblia. Alguns autores até criam a impressão ou, então, dizem abertamente: "A menos que você leia meu livro, não entenderá". Outros transformam a Bíblia num complicado quebra-cabeças, especialmente em questões relacionadas com o fim dos tempos. Claro, quanto mais complicado, mais se depende deles. Tudo isso ajuda a criar essa impressão de que interpretação bíblica é coisa esotérica, quando, na verdade, não é.
Ao ler a Bíblia, importa descobrir o sentido que melhor combina com aquilo que o escritor parece ter em vista. Importa buscar o sentido natural do texto, aquilo que qualquer pessoa de inteligência mediana extrai do texto, sem precisar de qualquer código ou chave interpretativa que supostamente apenas alguns têm. Até prova em contrário, o melhor sentido de uma passagem bíblica é o sentido literal[1].
As famosas cruces interpretum ("cruzes dos intérpretes"), isto é, textos complexos como Gl 3.20 e 1Co 15.29[2], não anulam essa verdade fundamental. Na Bíblia existem passagens que requerem um estudo mais aprofundado, e algumas delas parece que relutam em "entregar" o seu sentido. Agora, o essencial está claro a todos os leitores. E o essencial é, acima de tudo, a mensagem da redenção.
Revelação progressiva
A Bíblia é feita de dois testamentos, o Antigo e o Novo. No entanto, do ponto de vista cristão, os dois não estão em pé de igualdade. Isto porque o Novo Testamento (NT) interpreta o Antigo. Na prática, isto quer dizer que o Antigo Testamento (AT), que constitui dois terços da Bíblia, é lido à luz do Novo.
Passagens como Is 7.14 e Is 53, que, vistas em seus contextos no AT, se afiguram tão enigmáticas, são interpretadas no NT. Tanto assim que não se precisa mais perguntar de quem estão falando. Também não se precisa fazer de conta que não se sabe a quem esses textos se referem.
A restauração de Israel, de que falavam os profetas, se cumpriu, não com a criação do Estado de Israel, em 1947, mas, como fica claro no NT, com a vinda do reino de Deus em Jesus Cristo (Gl 6.16; Fp 3.3; lPe2.9).
A perspectiva missionária que norteia a ação da Igreja é a que aparece no NT. Ela é basicamente centrífuga, isto é, implica um movimento de Jerusalém para o mundo, em contraposição à perspectiva do AT, que era basicamente, embora não de forma exclusiva, centrípeta, ou seja, esperava-se que as nações fossem a Jerusalém (Is 2.2-4; Is 60.4-9).
Este princípio se aplica também ao sábado e ao dízimo. Tudo aquilo que não foi reinstituído no NT, inclusive o sábado e o dízimo, foi abolido em Cristo.
Interpretação a partir da própria Bíblia
A Bíblia não se contradiz e interpreta a Si mesma. Ela tem uma unidade orgânica. Existe unidade na diversidade: muitas vozes, mas, em seu todo, um som harmônico.
A Bíblia também se explica sozinha. Ela é sua própria intérprete. Ela se interpreta de forma imediata ou direta, como, por exemplo, em Jo 2.19,21 e Jo 12.32,33. Ela também se explica de forma mediata, em paralelos, pela "analogia da fé", isto é, a soma das passagens bíblicas claras.
Interpretar a Bíblia pela própria Bíblia, à luz da própria Bíblia, é trabalhar com princípios hermenêuticos derivados da própria Bíblia. Por isso, importa estudar toda a Bíblia. A chave interpretativa do Antigo Testamento é o Novo Testamento. O segredo para se entender textos menos claros, textos com muitas figuras e símbolos, por exemplo, é recorrer aos textos que expressam tudo de forma clara e direta.
A importância do leitor comprometido
De uns tempos para cá, em teoria da literatura, passou-se a falar do leitor ideal ou leitor modelo. Este leitor encontra-se, por assim dizer, dentro do texto. Umberto Eco define o leitor modelo como "um conjunto de condições de êxito, textualmente estabelecidas, que devem ser satisfeitas para que um texto seja plenamente atualizado no seu conteúdo potencial" (ECO, 1986, p.45). Em outras palavras, o autor determina, no ato de escrever, quem estará em condições de ler o seu texto[3].
Quem é o leitor modelo, no caso da Bíblia? Quem consegue satisfazer as condições de êxito que o autor, Deus, espera? No caso do AT, pessoas que conhecem a língua (originalmente o hebraico e o aramaico), que estão familiarizadas com a cultura e, acima de tudo, que são membros do povo de Deus. No caso do NT, pessoas que conhecem a língua (originalmente o idioma grego), a cultura judaica e greco-romana, a Escritura como um todo, e que abraçam a fé. Escritores bíblicos como Paulo, em Rm 1.7, e também Lucas, em Lc 1.4, para citar apenas dois exemplos, esperam um leitor cristão (2Co 3.15-16).
Isto significa que o leitor cristão não precisa pedir desculpas por ler a Bíblia sob uma perspectiva cristã. Por ser quem ele é, o cristão é a pessoa mais bem preparada para entender a mensagem da Bíblia. Afinal, a Bíblia foi escrita para ele.
Fonte: Do Livro Princípios de interpretação bíblico de vilson scholz


[1] Entenda-se esse "até prova em contrário" como "até se encontrar um texto que claramente tem sentido figurado".
[2] Desta enigmática passagem alguém já enumerou 37 interpretações diferentes!
[3] Ao leitor implícito ou modelo corresponde o autor implícito ou autor modelo, que é o retrato do autor real que emerge do texto. É o autor que o leitor reconstrói a partir do texto. Tal noção permite afirmar, por exemplo, que os livros dos profetas menores, embora escritos por autores reais diferentes, revelam um autor implícito semelhante. Isto porque o ponto de vista e o autor implícito que emergem são praticamente os mesmos em todos eles. Por outro lado, um mesmo autor real pode escrever obras diferentes, cada uma delas com um autor implícito diferente. Há quem argumente que isto explica as diferenças entre, digamos, 1Timóteo e Romanos. Ambos foram escritos pelo mesmo autor real, Paulo, mas o autor implícito que emerge de ambas é diferente. Obras formalmente anônimas, como a carta aos Hebreus, têm um autor implícito.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Os Atributos Morais de Deus (Louis Berkhof)

Continuado nossa série de estudos na Teologia Sistemática de Louis Berkhof, falaremos de alguns Atributos de Deus como o que segue.

Atributos Morais.
Os atributos morais de Deus são geralmente considerados como as perfeições divinas mais gloriosas. Não que um atributo de Deus seja em si mesmo mais perfeito e mais glorioso que outro, mas, relativamente ao homem, as perfeições morais de Deus refulgem com um esplendor todo seu. Geralmente são discutidos sob três títulos: (1) a bondade de Deus; (2) a santidade de Deus; e (3) a justiça de Deus.

1. A BONDADE DE DEUS. Esta geralmente é tratada como uma concepção genérica, incluindo diversas variedades que se distinguem de acordo com os seus objetos. Não se deve confundir a bondade de Deus com Sua benevolência, que é um conceito mais restrito. Falamos que uma coisa é boa quando ela corresponde em todas as suas partes ao ideal. Daí, em nossa atribuição de bondade de Deus, a idéia fundamental é que Ele é, em todos os aspectos e por todos os modos, tudo aquilo que deve ser como Deus, e, portanto, corresponde perfeitamente ao ideal expresso pela palavra “Deus”. Ele é bom na acepção metafísica da palavra, é perfeição absoluta e felicidade perfeita em Si mesmo. É neste sentido que Jesus disse ao homem de posição: “Ninguém é bom senão um só, que é Deus”, Mc 10.18; Lc 18.18, 19. Mas, desde que Deus é bom em Si mesmo, é também bom para as Suas criaturas e, portanto, pode ser chamado a fons omnium bonorum. Ele é a fonte de todo bem, e assim é apresentado de várias maneiras na Bíblia toda. O poeta canta: “Pois em ti está o manancial da vida; na tua luz vemos a luz”, Sl 36.9. Todas as boas coisas que as criaturas fruem no presente e esperam no futuro, fluem para elas deste manancial inexaurível. E não somente isso, mas Deus é também o summum bonum, o sumo bem, para todas as Suas criaturas, embora em diferentes graus e na medida em que correspondem ao propósito da sua existência. Na presente conexão, naturalmente, damos ênfase à bondade ética de Deus e a seus diferentes aspectos, como determinados pela natureza dos seus objetos.

a. A bondade de Deus para com Suas criaturas em geral. Esta pode ser definida como a perfeição de Deus que O leva a tratar benévola e generosamente todas as Suas criaturas. É a afeição que o Criador sente para com as Suas criaturas dotadas de sensibilidade consciente como tais. O salmista a exalta com as bem conhecidas palavras: “O Senhor é bom para todos, e as suas ternas misericórdias permeiam todas as suas obras... Em ti esperam os olhos de todos, e tu, a seu tempo, lhes dás o alimento. Abres a tua mão e satisfazes de benevolência a todo vivente”, Sl 145.9, 15, 16. Este benévolo interesse de Deus é revelado em Seu cuidado pelo bem-estar da criatura e corresponde à natureza e às circunstâncias da criatura. Varia naturalmente em grau, de acordo com a capacidade que os seus objetos têm de recebê-lo. E embora não se restrinja aos crentes, somente estes manifestam apropriada apreciação das bênçãos que dela provêm, desejo de usa-las no serviço do seu Deus e, assim, desfrutam-na em medida mais rica e mais completa. A Bíblia refere-se a esta bondade de Deus em muitas passagens, como Sl 36.6; 104.21; Mt 5.45; 6.26; Lc 6.35; At 14.17.

*O Próximo atributo será “O amor de Deus”. Aguardem!!